Discutindo o racismo texto 2 - Desconstruindo Ruth Catala
Viralizou desde sexta feira (03/03/2017), (recebendo a coroa
de quase branca pela MBL) um vídeo de uma youtuber falando ainda sobre o caso
da garota branca que foi supostamente agredida por usar turbante.
Neste vídeo, Catala fala sobre vários temas que a comunidade
preta vem discutindo na internet, desmerecendo-os todos, e taxando as lutas de
diferentes comunidades como “mimimi”.
Durante essa história toda do turbante, alguns vídeos falando
sobre o tema circularam bastante pela net. A maioria desses compartilhadas por
negros, (falando de uma esfera pessoal apenas um branco no meu ciclo de
conhecidos compartilhou a visão de um negro sobre o caso. Enquanto vários
outros brancos quiseram entrar na discussão contra o termo apropriação cultural
e até mesmo negando o racismo.)
Já o Vídeo da Ruth está sendo compartilhando por negros,
brancos e não negros. E grupos como MBL que se posiciona sempre contra as
minorias estão a aplaudindo de pé.
Primeiro, vamos parar e pensar porque um negro falando de
racismo é como se falasse ao deserto? Porque quando o negro sofre o racismo ou
se pronuncia sobre ele, o silêncio e a inação é o que predomina?
Por outro lado, se um negro disser que nunca sofreu racismo,
que não se ofende com piadas preconceituosas e que acha todas essas discussões
sobre discriminação são mimimi, pessoas de todas as cores vão se pronunciar e
concordar com ele? Darei meu parecer
sobre isso ao final do texto.
Agora, vamos falar dos argumentos de Catala; Ela inicia
falando que não usa turbante como valor cultural, apenas por ser livre e por
achar bonito. Ok, para uma angolana que cresceu rodeada de pessoas usando
turbantes o valor do acessório é completamente diferente que para um
brasileiro, já que o uso de turbantes durante muito tempo foi sempre segmentado
e o uso dele sempre foi visto com maus olhos.
Neste trecho também ela começa o deboche sobre a postura dos
negros, levando para o geral uma atitude que é bem pontual e que a chance de
acontecer é bem pequena (um negro atacar uma pessoa branca por uma questão ideológica).
Ela contra argumenta a apropriação cultural dando o exemplo de
“quantas coisas que não são de nossa cultura estão em nossos guarda-roupas e
que nós usamos”. Em uma sociedade
igualitária onde o negro não foi escravizado e vários de seus costumes
culturais reprimidos, esta fala seria corretíssima. Porém no nosso mundo, não é
tão fácil buscar viver por nossa cultura. Em um contexto de globalização
então... A nossa escolha sobre o que consumimos é bem reduzida.
Novamente, ela parte do micro, falando sentimentalmente da
pobre menina com câncer. (torço pela melhora dela e que ela possa usar
turbante, peruca e seu próprio cabelo)
A gente como negro em todo lugar, temos sempre que tomar
cuidado com nossas atitudes, pois cada erro nosso, nunca é só um erro pessoal.
Se faço algo errado já ouvi várias vezes um “olha lá, serviço de preto”. Então essa suposta ação de uma negra que
ninguém sabe se aconteceu da forma que foi narrada, acaba sempre sendo ampliada
a todos os negros e vão usar outro estereótipo “Nossa, esses negros são tão
agressivos... como pode atacar uma menina com câncer por um simples turbante”
Se existe um movimento negro que está saindo pelas ruas
cortando dreads, tranças e arrancando turbantes de todo branco que encontra
pela frente, eu não estou sabendo.
Se esta é uma pauta em qualquer lugar, uma luta, como Catala
fala no vídeo. Eu não estou sabendo também.
“é por causa de atitudes de negros como a que abordou a Tauane
é que a luta de muitos negros é ridicularizada” ?
Não, com atitudes ou não como essa, a luta de negros é
sempre ridicularizada. Como ela mesmo acabou de fazer. Usando novamente, uma
perspectiva pessoal para falar de toda uma estrutura que tenta sempre
desvalidar a luta do negro.
Meus amigos! Negros foram esquartejados, enforcados,
queimados e até hoje são presos em postes ou assassinados por nada (apenas por
serem negros, e por um branco ou não negro, achar que aquele não era seu lugar).
Em casos como esses nunca alguém grava um vídeo para falar “Olha como todo
Branco é perverso e violento...”
Ano passado, com a polemica do Oscar sem negros muitas
pessoas falaram como Ruth “o mundo com tantos problemas e vocês brigando por
indicação em Oscar?”
Não Ruth e turminha, a luta por menor que possa parecer é uma só: a luta é para sermos visto como seres humanos, de que nossas histórias possam ser contadas e que possamos ser o que a gente quiser, sem medo e ser reconhecidos. Será que sem a luta de Spike Lee ano passado Moonlight ganharia algum oscar este ano? Será que teríamos destaque para produções de negros como teve este ano? Claro que não.
Não Ruth e turminha, a luta por menor que possa parecer é uma só: a luta é para sermos visto como seres humanos, de que nossas histórias possam ser contadas e que possamos ser o que a gente quiser, sem medo e ser reconhecidos. Será que sem a luta de Spike Lee ano passado Moonlight ganharia algum oscar este ano? Será que teríamos destaque para produções de negros como teve este ano? Claro que não.
Ai a nossa queridinha dos brancos vai dizer “para de gritar
que você é negro e enfiar sua arrogância blablabla, coisa de cachorro que
blablabla” E lista grandes personalidades que não brigaram por turbantes, como
se existisse algum negro brigando na câmara dos deputados por uma lei que proíbe
brancos de usar turbante... E é aqui que
a galera começa aplaudir. Porque é uma negra diminuindo negros. Uma negra
falando para você calar a boca, algo que todo branco racista gostaria de dizer,
porém pela luta de tantos, cada vez mais estamos tendo direito a fala. Nesta parte ela busca demonstrar conhecimento
das causas negras, citando a frase mais batida de Nina Simone... Fala pro negro
ir estudar, o que é um conselho sempre válido. Mas como se só ela o tivesse
feito, e que todas as outras pessoas são tapadas.
Nossa amiga até aqui, já usou grande parte do repertório de
pessoas preconceituosas “mimimi” “vitimismo” e o racismo reverso vem em seguida
com as frases “Negros querem mostrar que podem escravizar os brancos?” “Todo
mundo sofre algum tipo de discriminação” então parem de ser vitimistas... Então esse tal de racismo é coisa pequena...
uhum... senta lá Ruth.
Não vou perder tempo falando sobre Racismo estrutural e suas
consequências. Mas em nenhum momento uma luta contra qualquer tipo de
preconceito foi desmerecida por algum movimento negro. Nunca se ralativisou “ah
mas o preconceito de gente gorda, gay ou gente alta é mimimi, vitimismo” Porque
usam esse argumento para desmerecer o racismo?
Ai ela vai dizer que a discriminação hoje em dia não é tanto
racial, é econômica... olha só! O capitalismo foi muito bom com os negros.
Existem milhões de famílias negras produtoras de chocolate MILIONÁRIAS.
Milhares de extratores de diamante negros, donos de mansões iates e etc. Dados
comprovam que a renda média de negros, hoje em dia são igual ou maiores que a
de qualquer branco. Só que não.
OS últimos 3 minutos de vídeo são uma idiotice atrás da
outra atacando várias manifestações negras de maneira rasa. E a parte que tanto
negros quanto brancos adoram. “olha, nem sempre que alguém pergunta se vc trabalha
aqui, ela está sendo racista” Caramba Ruth, sério? E eu aqui sofrendo atoa todo
esse tempo!
“Se um branco vestir uma camisa orgulho de ser branco e sair
pela rua, é capaz de ser linchado pelos negros” Sério? Que país isso
aconteceria? Talvez se esse branco em
questão for desfilar em uma periferia, ou comunidade negra, é bem capaz que não
sofra nada, e que alguém mais esclarecido vá conversar com ele e dizer “Cara,
eu não sei o que você quer aqui vestido assim, mas pode ser que alguém não seja
tão legal quanto eu e não curta muito essa sua postura”. Se essa mesa pessoa
andar na Av. Paulista hoje não vai acontecer nada com ela, e se alguém tentar
ser agressivo, este orgulhoso branco vai ganhar escolta policial.
Porque? Branco não é um grupo cultural, não é um país, não é
um estilo de vida, não é um estilo de música. É a penas a cor de pele de
algumas pessoas, que historicamente, passaram a comandar algumas áreas do globo
terrestre. O que essa pessoa que tem orgulho de ser branca está querendo dizer?
Ela está querendo apenas atacar as pessoas que não são.
É bem diferente de alguém vestir uma camiseta “orgulho de
ser irlandês”, “orgulho de ser Padeiro”, ou até o “orgulho de ser negro” é tão
bobo quanto qualquer outro exemplo. Mas é sim resistência, pois em um sociedade
que te oprime por ter mais melanina, e que estruturalmente te ensina a ter
vergonha de ter a pele escura. Se dizer orgulhoso do que você é, é uma pequena
revolução. Uma vitória muito grande para este indivíduo.
Juntando com o deboche sobre uma discussão profunda sobre
beleza, representatividade, marcas da escravidão que ela resume “papinho sobre
a Solidão da mulher negra” (que a genialidade de Catala soluciona dizendo para
as pessoas comprarem um cachorro.)
Chegamos na melhor frase usada por grandes preconceituosos “O
grande problema de alguns negros é que eles mesmo se discriminam e acham que
todos a sua volta estão fazendo o mesmo” Ela acabou de se resumir, eu imagino.
Existem negros que aprenderam a ter vergonha de ser negros, outros negros que
nem se consideram negros, isso acontece pelo racismo estrutural (novamente). Essas
pessoas são massacradas com mensagens que a rebaixam, as vezes diretamente, as
vezes subliminar mente. Elas aprendem a reproduzir o racismo e isso é mais uma
perversidade do sistema que Ruth aponta como uma falha ética e de caráter de
todo preto.
Após debochar do racismo que muitos sofrem dizendo que “nem
sempre é racismo quando...” Ela finaliza sendo obvia e defendo o que todos
defendem que “a luta pela humanidade”. Bravo, preta. Você criou um texto muito
bem amarrado para agradar brancos e enganar negros como se você realmente
estivesse falando para eles.
Concluindo.... porque negros, brancos e não negros vão
compartilhar e aplaudir esse vídeo.
Primeiro, porque o texto de Ruth é bem decorado e escrito
utilizando o deboche e o micro para falar do macro. Como todo preconceituoso
ela busca frases e situações caricaturadas e estereotipadas para falar de um
todo. E atribui a toda uma luta negra, questões pequenas ou tratadas de maneira
rasa. Utilizando hashtags como Mimimi, vitimismo e etc. (por isso os branco vão adorar).
Segundo, por ser negra angolana e por uma boa dicção e
postura, Ruth inspira credibilidade. E para qualquer negro que não lê e estuda
sobre o preconceito, racismo e tem consciência do seu papel social enquanto
indivíduo negro. É ótimo ouvir alguém dizer que quem é engajado está de mimimi
é vitimista. Pois para esse negro comum, que conta piada sobre racismo, e ri
dos estereótipos do preconceito, que casa com a loira (pois o que conta é o
amor e não a cor), para o negro bem sucedido e para o que não pensa sobre o
preconceito em si. Para ele é ótimo ouvir alguém dizer que não está errado, que
os outros são os que estão viajando. É a mesma postura que alguém que come
carne e decide atacar um vegetariano ou vegano. A pessoa se sente mal por alguém
estar fazendo algo que acredita, se sente inferiorizado por não tomar a mesma
atitude e vai querer mostrar pro vegetariano que ele é incoerente, errado, tão
assassino quanto quem come carne. E é por isso que os negros vão compartilhar e
aplaudir. Porque alguém está o liberando de pensar sobre o racismo e do seu
papel social enquanto negro em uma sociedade preconceituosa. Aquela pessoa que “nem
é tão negra assim” também vai compartilhar, por não sofrer o racismo ou por ser
bem aceita por brancos, também vai compartilhar e aplaudir.
Se você concorda com a fala da Ruth, você precisa muito
seguir o conselho dela “vai estudar”
Se você é branco e está compartilhando e concordando com a
Ruth, você só quer alguém que te redima do seu preconceito. Seja uma pessoa
melhor.
E para todos, vamos parar de minimizar a luta do negro por
igualdade contra o racismo. Isso não é mimimi, não existe vitimismo.
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